quinta-feira, 11 de março de 2010

As luvas de pelica e o humor de Almodóvar

Ontém assisti a um desses filmes deliciosos, feitos em um época em que eu ainda nem era nascida. Trata-se de Maus Hábitos (Entre Tinieblas-1983), o terceiro longa metragem do roteirista/diretor Pedro Almodóvar.
Acho que um pouco dessa minha personalidade afirmativamente nostálgica, ajuda-me a ter uma admiração maior pelos filmes antigos de meus diretores mais queridos. Maus hábitos é um açoite a tudo o que eu aprendi em minha educação católica. Nesse filme encontramos como um núcleo cômico/trágico quatro freiras, as "redentoras humilhadas", religiosas lascivas, gulosas, e viciadas em drogas pesadas como heroína e àcido. As irmãs em questão: Esterco, Rata de esgoto (um dos personagens mais cativantes que já vi, interpretada por Chus Lampreave), Perdida e Víbora, auto denominadas assim, pelo que seria parte dessa humilhação proposta como castigo e subserviência.



Trata-se de algum daqueles exercícios ao qual temos acesso apenas através da arte. O ato do desapego de valores, pré conceitos e estereótipos, e que a partir das mãos de Almodóvar, encontram coerência mesmo em se tratando das mais bizarras histórias. De freiras viciadas a um tigre doméstico morando em um convento. Com ele há sempre uma segunda chance para os desamparados e julgados pela sociedade como seres baixos e inferiores, ele arregala os nossos olhos, e nos mostra que todos temos defeitos, erros, e nem por isso deixamos de ser humanos e de buscar o amor. Este, o objetivo principal de todos os seus heróis (principlamente heroínas), em detrimento das leis do Homem e recorrentemente, a despeito das leis de Deus.

Ele traz muito desse rancor ou leitura pessoal, como queiramos entender, a respeito da Igreja católica, cenário onde foi educado desde a infância (ver seu filme considerado autobiografico: Má Educação - 2004, sobre padres, pedofilia e homossexualismo).
Maus Hábitos, segundo o livro "Conversas com Almodovar", foi patrocinado por um milionário de Madri, que teria colocado como condição que sua namorada/mulher Cristina S.Pascual, a pouco expressiva cantora Yolanda Bell do filme, que vai morar no convento em busca de refúgio, estrelasse a história. Ela é o interesse romântico da musa (real) de Almodovar, Carmen Maura, a irmã "Perdida'.
Apesar de todo o enredo maluco e pouco ortodoxo, Pedrão consegue nos emocionar, e nos equiparar a esses personagens tão abomináveis às leis da sociedade, e este é o grande mérito dele, fazer o impossível, e ainda nos tirar boas risadas.

Como dica, fica um dos que podem ser considerados predecessor do estilo Almodovar de direção. O italiano Federico Felline (La Dolce Vita - 1960) em um de seus últimos longas: Ginger e Fred (1985), sobre o reencontro de um casal de bailarinos depois de anos, já senhores, em um programa de Televisão. O filme mostra um tipo de crônica a essa tecnologia, e seu fator dinâmico e pouco sensível, quase desumano. Traz Marcelo Matroianni, um dos maiores galãs da década já por volta dos seus 70 anos dançando com sua Ginger, Giulleta Massina. Muito bom e tocante.

Nenhum comentário:

Postar um comentário