sábado, 8 de dezembro de 2018

Me encanta!


O sonido da língua catalã se tornou familiar não somente por estar morando em Barcelona, mas afetivamente falando pela maravilhosa série Merlí (2015-2018) criada por Héctor Lozano, e estrelada pelo maravilhoso Francesc Orella, que narra a saga do professor de filosofia anti herói que dá nome a série, e que nos escandaliza com seu jeito cético, objetivo, hedonista, sofista e no final das contas, extremamente generoso de levar a vida. Acho que nunca mais pensarei no arquétipo do anti herói sem lembrar de Merlí, dane-se o House, Walter White e o Frank Underwood.

Acabo de terminar essa série que alguns descrevem como um tipo de “Malhação”, por se tratar de uma história que se passa no Ensino Médio espanhol, o bacharelato, com as idas e vindas amorosas, de amizade, e tudo que envolve essa fase complexa da vida.

Merlí para mim alcança algo ainda muito maior quando no Brasil discutimos a Escola sem partido, e um professor, de forma extremista por motivos dramáticos, escancara o seu conhecimento profundo na luta contra nocividade da forma como construímos essa sociedade e até mesmo o modelo educacional que tranca jovens no auge da sua potência em uma sala de aula, sentados por horas. É reconfortante ouvir as palavras que saem da boca de Merlí Bergeron, e fica clara a nossa profunda necessidade de Filosofia, e de como ele diz sempre, de repensar ou até mesmo abolir essa ideia zuada que é a “normalidade”.

Merlí me leva a pensar sobre a produção recente espanhola, junto com o fenómeno de La Casa de Papel (2017) de Álex Pina, e a sensação de saudade que esses personagens tão humanamente profundos me deixam, é algo para se tomar nota. Os espanhóis sabem construir personagens e principalmente dirigir esses atores para os melhores resultados que tenho visto no Netflix, por que não? A princípio a atuação, principalmente de La Casa de Papel, pode parecer um pouco exagerada e novelesca, mas tem uma pimenta latina a mais, uma paixão no que é entregue pelo envolvimento claro dos atores com seus personagens.




Espanha, tô aqui, me chama pra fazer essa maravilhosidade junto com vocês!

quinta-feira, 6 de dezembro de 2018

Filme de atores

Quando estou em dúvida frente a um catálogo cheio de opções de filmes nos "backups" que fazemos para a Internet, como diria um amigo meu, existem duas dicas infalíveis:

1) Entender quem está envolvido na direção e roteiro, ou simplesmente que está no elenco;
2) Se o filme for produzido, dirigido e estrelado por grandes desconhecidos, não se acanhe, e dê uma olhada boa no trailer, se mexeu com você pode assistir, eu evitaria olhar as críticas porque eu pessoalmente nem sempre concordo com elas, sério, Closer teve 68% no Rotten Tomatoes, quando pra mim merecia no mínimo uns 90. 

Levando em consideração o primeiro tópico, existem muitos atores confiáveis em matéria de escolha de filmes, *exemplos:
*infelizmente vou focar aqui no Cinema norteamericano, ainda estou devendo um aprofundamento maior no demais Cinemas, mas tem bônus track Brasil também!

- Kate Winslet: ela vai do drama a ficção a comédia romântica ao sci fi, e eu pessoalmente nunca me desapontei, uma gênia!

- Cate Blanchett: idem, outra monstra sagrada. 

- Viola Davis: sempre um espetáculo especial a ser admiro ver essa mulher em cena, e não conheço filmes ruins com ela.

- Forest Whitaker: me apaixonei por ele em "O último rei da Escócia", um monstro que vira e mexe aparece e dá todo um adendo especial pra história, com sua cara tão particular que vai da loucura e da maldade para o bom humor.

- Brad Pitt: o bonito tende a ter um bom olho pra scripts sim, e está em um dos meus filmes preferidos de todos os tempos, "Clube da luta"

- Leonardo Dicaprio: e já que passamos pelos crushes dos anos 90, idem para o Leozinho, que aliás, vira xodó de todo grande diretor com quem trabalha...Scorcese não larga mais!

- Julianne Moore: incrível, sempre roubando a cena, em qualquer papel que se propõe.

- Greta Gerwig: minha mais nova obsessão, espelho, quem eu quero ser, e que tem minha idade. Além de ser uma atriz fantástica, também estreou arrasando como roteirista e diretora em "Lady Bird", com indicação ao Oscar e tudo!

- Ethan Hawke: ele está em nossas vidas a muito tempo, e segue sendo lindo e super relevante, vou me aprofundar mais nesse cara abaixo, porque ficou inevitável depois de encontra-lo em dois filmes recentes.

PS USA: Cuidado com Robert de Niro, Jennifer Aniston, Sandra Bullock, Julia Roberts, caramba, eu já vi filme ruim até com o Robin Williams (saudade) :(

Bônus track Brasil: Marjorie Estiano (porque sim!!! Assistam "As boas maneiras", é fera), Irandhir Nascimento e o Jesuíta Barbosa, que são o par magia do maravilhoso "Tatuagem", estou acompanhando esses caras desde então, e não tem erro, todas as séries cabeçudas da Globo precisam deles, parece que falta ator profundo no Brasil, mas não quero concordar com isso.

Agora, falando do Ethan...

Minha primeira lembrança dele é em "Sociedade dos poetas mortos" (1989) - direção Peter Weir e roteiro Tom Schulman - saudades de novo Robin Williams - e realmente foi o terceiro filme de sua carreira, como o sensível Todd Anderson, que pensando bem deve ter tido alguma inspiração na construção do personagem Joan de Merlí, que vale outro texto. Ele foi casado com a Uma Thurman, foi boy lixo e fez o Jude Law com a babá dos filhos antes do Jude Law, mas enfim, estamos preferindo boys lixos a estupradores hoje em dia, chegamos nesse ponto. 

Um ponto alto da sua carreira com certeza é a trilogia das cidades européias que ele e sua parceira de cena Julie Delpy, construíram com o diretor Richard Linklater, "Antes do nascer do sol" (1995), "Antes do por do sol" (2004 - o segundo sempre é o melhor das trilogias), e "Antes da meia noite" (2013), que conta a história de amor do norte-americano Jesse com a potente francesa Celine, desde a adolescência até a maturidade, digamos assim, é um filme com muito bla bla bla existencialista, J'ADORE!

Ainda com Linklater nessa pegada produção de uma vida toda, teve o premiado Boyhood (2014), que acompanhou a vida de um ator desde a infância até a adolescência, incrível, com um aplauso extra para a performance vencedora da Patricia Arquette e um dos melhores discursos do Oscar, que rendeu o melhor meme da Meryl Streep.

E a razão de eu querer escrever sobre esse cara, é porque eu tenho buscado feel good movies de qualidade, e sei como é difícil fugir do clichê depois de tantas décadas de cinema romântico, e lá estava Ethan arrasando em ambos os filmes:

"Maggie's Plan" (2016), escrito e dirigido por Roberta Miller, com as supracitadas Juliane Moore e Greta Gerwig, e eu só vou dizer que é uma história de amor super não convencional, com um certo quê woodyallenesco. 

"Juliet, Naked" (2018), dirigido por Jesse Perez e escrito por esse monte de gente: Tamara Jenkins, Jim Taylor, Evgenia Peretz e Phil Alden Robinson, com a superestimada Rose Byrne (dicurpe, eu acho), e um filmaço despretensioso com tempero british.

Bon provecho a todos!

quarta-feira, 31 de outubro de 2018

Filmes para sobreviver ao anti-cristo brasileiro

Faz anos que eu não escrevo nada nesse blog, mas agora com a possibilidade de ócio, achei válido voltar para esse espaço, e também por que como não fazia há certo tempo tenho assistido a muitos filmes, gracias Popcorn Time! <3 p="">
O título desse post ilustra o que eu literalmente tenho feito desde o resultado do primeiro turno da eleição brasileira para presidente do Brasil, fuga! Em um balanço rápido entre a minha saúde mental que já não andava super bem pelas dificuldades de imigrar, o clima de animosidade entre familiares e amigos bolsominions, e as milhões de fake news, resolvi apelar para a sétima arte, não sem o adendo de insistir para que sigamos lendo muito, poesia principalmente, e para que meditemos.

Seguem sem mais delongas os conteúdos consumidos:

Sorry to bother you - 2018 - Direção e roteiro original Boots Riley, com Lakeith Stanfield (Atlanta), Tessa Thompson (West World), e participação de Danny Glover. Eu estava aguardando muito esse filme pelo buzz gerado principalmente na conta do Instagram de Lakeith, esse gato que eu comecei a seguir depois de assistir Atlanta de Donald Glover a.k.a Childish Gambino. Sorry to bother you, ou "Desculpe-me o incômodo", vem da mesma safra de filmes geniais como "Get out", que não se apegam muito a gêneros tradicionais como comédia ou terror, e seguem fiéis a mensagem que querem passar de maneira pop, tudo indica que esse é o futuro. Resumidamente o filme conta a história de um cara negro que começa a trabalhar em um call center e só consegue ser bem sucedido com sua "voz de branco". Foda!




Crazy Rich Asians - 2018 - Direção de John M. Chu, com roteiro de Peter Chiarelli e Adele Lim, adaptado do livro homônimo de Kevin Kwan, com Constance Wu e Henry Golding (A Small favor - outro filme incrível!). Esse filme fez bastante barulho nos EUA pelo elenco todo asiático, e o marco que é isso para o cinema caucasiano norte americano. Uma comédia romântica clássica com os melhores temas feministas, desde sororidade, mãe solo, a mercado de trabalho. Entretenimento saudável e de qualidade "para toda a família" de bem! Peguem essa nova Cinderela se não é mara?!

                      


Blackkklansman- 2018 - Direção Spike Lee e roteiro Charlie Wachtel, David Rabinowitz, Kevin Wilmott e Spike Lee, com John David Washington e Adam Driver (Girls). Um retorno de classe para o fantástico Spike Lee (Faça a coisa certa!), com produção do mesmo Jason Peele de "Get out", Blackkklansman conta a história REAL do policial norte-americano negro Ron Stallworth, que nos anos 70 conseguiu se infiltrar em nada mais nada menos que a Klux Klux Klan, do mesmo amigo do nosso presidente, David Duke, na época líder da "organização".  O filme é incrível, além do figurino, tem a tradicional trilha sonora bombada dos filmes do Spike Lee (e tem também a série dele "Ela quer tudo", no Netflix), e a óbvia contemporaneidade dos fatos. All power to the people!

                       

Ocho apellidos catalanes - 2015 - Direção Emílio Martínes-Lázaro, roteiro Borja Cabeaga, Diego San José Castellano, com Clara Lago, Dani Rovira, Karra Elejalbe e Carmen Machi. Sequência de "Ocho apellidos vascos", encontrei esse filme na Netflix aqui da Espanha, e de novo, buscando risadas, descobri que já compreendo muita piada interna da Espanha e da Catalunha. A direção e os atores são incríveis, e Carmen Machi  (El Bar), já percebi que é figura carimbada nas películas espanholas, a Fernanda Montenegro deles, if you will...

                         

Paterson - 2016 - Direção e roteiro original Jim Jarmusch, com Adam Driver e Golshifteh Farahani.  Paterson reapareceu para mim na minha rotina tradicional de olhar os comentários e porcentagem de aceitação dos críticos no Rotten Tomatoes, sempre depois de assistir a filmes, depois de assistir ao supracitado Blackkklansman, cliquei em Adam Driver e encontrei esse título que me lembrou de ter sido um dos filmes que eu queria assistir e não consegui, em alguma Mostra Internacional de Cinema de São Paulo. Gosto muito do Jim Jarmusch, e pela sinopse percebi que teria um match com a minha atual situação. Paterson fala da poesia do cotidiano, na história de um motorista de ônibus na cidade com mesmo nome, e no dia a dia dele com sua esposa, sem nada de glamour, com aquele gosto delícia da simplicidade adorável. Amei demais!

                     

*Bônus track para New Girl, meu novo "Friends", que me proporcionou risadas deliciosas, obrigada Jess, Nick, Schmidt, Couch, Cici e meu amorzinho Wilson!

segunda-feira, 24 de março de 2014

Sobre Lars não ser um cavalheiro, e por que isso o torna fantástico

Recapitalundo: Lars é nerd, fanfarrão, rebelde, um fantástico criador de personagens, realista, mas ele não é um cavalheiro.

Lars cria heroínas exuberantes e as coloca nas situações de maior desamparo, vulnerabilidade e violência. Ele não economiza ao entregar o fardo a elas, e isso acontece mais um vez com Joe, em Ninfomaníaca. Ele não é um cavalheiro, mas isso o torna o cineasta mais feminista.
O cavalheirismo, por mais bonitinho que se apareça (e bem intencionado sim), tem em sua constituição a ideia de que as mulheres são frágeis, incapazes até, parte-se da premissa de elas precisam de ajuda para abrir a porta, para chamar o garçom, escolher uma mesa, pagar a conta. Em última instância, o cavalheirismo as subjuga à sombra protetora masculina. Ao pai, depois ao marido, nunca como senhoras de si. A boa moça se veste e se comporta apropriadamente, ela cruza as pernas, ela não expõe sua sexualidade, jamais.
As mulheres de Lars são o contrário de tudo o que se diz sobre o bom comportamento feminino, e elas sofrem, e são humilhadas por isso. Lars foi criado por pais nudistas, e tinha uma mãe que decidiu contar de forma dramática, à beira da morte, que seu pai de criação não era seu pai biológico, que seria na verdade, um amante que ela havia tido no passado. Essa história não transmite propriamente a genialidade desse homem, mas talvez dê pra entender de onde vem o sarcasmo mais volátil do cinema mundial.

-------SPOILER-------------------------------------------------------------------------------------------

Eu fui surpreendida, depois de toda a publicidade em cima do filme, ao assistir ao volume 1 de Ninfomaníaca. Todo o sexo explícito, sem falar no próprio tema, e os cartazes mostrados, me levavam a crer, encontrar mais pra frente um filme extremamente forte e sexual, e não a história que é contada com tanta naturalidade e por que não, bom humor. Eu não deveria ter me surpreendido. É como se toda a publicidade feita, tenha sido um grande trote do Lars, o que se conclui no volume 2. Não que o filme não seja forte, ou não tenha cenas explícitas, mas um de seus antecessores, Anticristo (2009), pode ser considerado muito mais sexual, aliás, no volume 2, Lars faz uma paródia da famosa e deslumbrante cena inicial desse filme, com um final um pouco mais otimista, usando a mesma trilha e os mesmos efeitos, é Lars se divertindo com a nossa cara (por que ele é um fanfarrão).
Em Ninfomaníaca escutamos a história de Joe (Charlotte Gainsbourg - a mesma de Anticristo), que está entre uma das minhas personagens preferidas do cinema no momento, a própria ninfomaníaca auto-diagnosticada, que nos aparece como um ser humano originalmente bom, extremamente fiel aos seus instintos. Quem a escuta é Seligman (o sempre presente Stellan Skarsgard, mais conhecido como meu sogro - http://goo.gl/hiYkuI), um virgem de 70 anos, um senhor que viu a vida toda através dos livros, o oposto completo de Joe (um nerd, assim como Lars). O que acontece nessa história, nos leva a uma empatia que cresce em relação a essa mulher, mérito grande para Charlotte, eu acredito ser impossível não entender sua força e coragem, até mesmo quando ela argumenta em favor de um pedófilo.
O desfecho quase me levou às lágrimas, e me fez repensar toda a filmografia de Lars, quando o bom Seligman rebate tudo que ocorreu com Joe, especulando se haveria toda essa polêmica em sua vida, se ela fosse um homem, (nesse momento eu me segurei para não levantar e bater palmas). Seligman (ao que parece), termina cobrindo-a docemente e deixando-a descansar.
Um beat, uma relexão, "teria o velho Lars amolecido com os anos, e realmente deixado uma mensagem otimista para todos nós?" Quando bum!O velho, virgem, e antes assexuado Seligman volta para praticamente estrupar Joe enquanto dorme, o final é um tiro e tudo fica escuro novamente no mundo, Lars dá sua última risada sarcástica.


PS: Lars, na voz de Joe, faz uma alusão ao acontecido em Cannes, quando diz a Seligman, algo como: A sociedade exalta aqueles que falam bonito, mas possuem más intenções, e execra quem fala mal, mas tem boas intenções - sobre o comentário nazista de Lars, que acabou expulsando-o da Premiere como persona non grata. http://goo.gl/7Eofq2

quinta-feira, 20 de março de 2014

Sobre Lars

Hoje eu retorno a esse blog tão esquecido, para falar de um roteirista, diretor, realizador, que me tem feito chacoalhar o pensamento, levantar a poeira e por que não, elevar o meu espírito: Lars Von Trier.
Como ponto de partida, tenho seu último empreendimento, o filme Ninfomaníaca, dividido em dois volumes, mas principalmente, o que é esse filme em relação a toda uma convivência com as demais realizações e mensagens que ele tem passado, desde os seus 11 anos de idade, quando começou a fazer filmes com sua super 8. Antes de falar propriamente do último, e por que eu o acho o melhor de todos os tempos - de todos os autores do mundo - gostaria de enumerar algumas características desse homem, dinamarquês, controverso e tido como excêntrico (esse adjetivo tão mal utilizado):

Sobre Lars:

Ele é um nerd:  entendendo “nerd”, por alguém que não é meramente culto, ou especializado em algum campo do conhecimento, mas aquele ser humano que sente tesão por informação, em seus mais diversos teores;

Um fanfarrão:  aquele cara que em absolutamente nenhuma ocasião, vai perder a oportunidade de fazer uma piada, Lars é muito estudado, mas não é refinado. Ele é o cara que faz piada em enterro e cutuca a viúva pra que ela possa rir com ele;

Um genial criador de personagens:  ele é capaz de criar as pessoas mais adoráveis e ao mesmo tempo mais cruéis já vistas (daí a veracidade que emana delas), e seu êxito está em não subestimar ninguém quando se trata da força, e ao mesmo tempo na sua capacidade de fazer o que é considerado mal;

Um rebelde: ele subverte as emoções, não se trata apenas de choque, ele entra no âmago, permite que criemos empatia, para depois desfigurar nossos sentimentos e rir do nosso choro contido. Não se pode levar para o pessoal, ele não quer atingir a mim ou a você, seu foco é a própria concepção da sociedade, o indivíduo existe na manada, se decidir sair dessa ordem, ele é eventualmente pisoteado.

Engraçado que ele faz isso como mera demonstração do que lhe aparece, eu não acredito que ele almeje algum tipo de revolução, Lars também é realista (pessimista jamais).

E por último, das afirmações, a negação:
Lars não é um cavalheiro.

Continua...